domingo, 7 de agosto de 2016

Lido: A Amizade

A Amizade (bibliografia) é mais uma noveleta de Telmo Marçal, duma ficção científica negríssima, passada entre os escalões mais baixos de uma sociedade repressiva económica e politicamente. Desta feita, o protagonista é um indigente que, após algumas peripécias, e não tendo outro remédio (mas sem grande sacrifício, reconheça-se) se vê colocado pela polícia numa fábrica com a função de farejar subversivos, agitadores, gente que ache que está a ser explorada e não goste da ideia. Há muito nesta história que não só a aproxima genericamente das outras histórias do livro, como faz lembrar uma em particular, O Paciente, o que pode levar a supor que as duas partilham o mesmo universo ficcional, ainda que isso em nenhum lado seja explicitamente reconhecido.

Trata-se de mais uma boa história, dura e cínica, bem escrita, especialmente no recurso que faz da linguagem oral e dos seus calões e ritmos, que tem como tema não só a miséria, a exploração e a forma como o poder tende a abusar, mas o valor que a amizade pode ter (ou não) nesse contexto. Por outro lado, também é uma história previsível, não por características próprias, mas por influência das histórias que a rodeiam. A distopia total sofre do mesmo problema das utopias, ainda que em sentido inverso: o leitor já sabe à partida que no fim tudo terá necessariamente de correr mal, porque é essa a lógica subjacente à história, e isso leva ao desaparecimento de um efeito surpresa que extravase os detalhes.

Contos anteriores deste livro:

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